Sobre o retorno da plataforma X e o que podemos aprender com esse caso.

Um breve contexto:

Vivemos um momento inédito no país, com poucos precedentes no mundo, onde uma plataforma privada desafiou, e até desmoralizou, a decisão judicial de um ministro da Suprema Corte. A tentativa de justificar suas ações com base na liberdade de expressão não funcionou. O descumprimento de ordens judiciais resultou no banimento da plataforma. Três exigências foram impostas: retirada de perfis, pagamento de multas e a nomeação de um representante legal no Brasil. Um mês depois, Elon Musk cedeu, provavelmente pressionado por questões econômicas, já que o Brasil é o sexto maior mercado da plataforma. Ele recuou e acatou as decisões judiciais, que foram tomadas de forma colegiada.

O que podemos aprender:

1. O poder da lei sobre grandes corporações

   O desafio de uma plataforma privada, comandada por um dos homens mais ricos e influentes do mundo, a um país do Sul Global, foi vencido por uma decisão colegiada da Suprema Corte, fundamentada na Constituição. A plataforma foi banida até que suas exigências fossem cumpridas. A ameaça à soberania nacional foi contida pela ação constitucional, resistindo ao poder econômico e ao controle da informação exercido pela plataforma. Vale lembrar que Musk continuou a criticar a decisão, alegando saber o que é ou não constitucional no Brasil. O exemplo deixa claro que a internet não é uma terra sem lei e deve respeitar as jurisdições territoriais onde opera, contrariando a ideia de um mundo virtual sem fronteiras.

2. A necessidade de regulação das plataformas digitais

   As plataformas digitais são disruptivas e devem ser reguladas. Toda a sociedade, de alguma forma, foi impactada por aplicativos e suas plataformas, seja no delivery, transporte, informação, produção de conteúdo, marketing, publicidade, entre outros. O caso do X demonstra a necessidade de uma regulação mais específica. Desde 2014, temos o Marco Civil da Internet, mas em uma década muita coisa mudou. A agência dos algoritmos evoluiu, e o surgimento de desinformação e da inteligência artificial trouxe novos desafios. O Brasil tem perdido oportunidades, e uma comissão para estudar o tema está parada na Câmara. A experiência mostra que um quadro regulatório traria segurança para empresas, governo e usuários. Países do Sul Global, como o Brasil, são mais vulneráveis a essas infraestruturas digitais e às questões políticas que elas levantam. Musk provavelmente não vai parar por aí, alinhado à extrema-direita internacional. Outras plataformas surgirão, e é essencial manter o foco e desenvolver uma regulação que fortaleça e atualize o Marco Civil, em diálogo com a sociedade.

3. O Brasil seguiu em frente sem o X

   O país não parou por causa do bloqueio do X. Isso revela que, talvez, haja uma supervalorização do poder dessas plataformas, algo que ajuda as Big Techs a lucrar mais. O X e o poder financeiro não superaram a lei e a Constituição de um país fora do Norte Global. Descobrimos que podemos viver sem o X. Embora algumas pessoas que trabalham diretamente com a plataforma tenham perdido oportunidades, e usuários que a utilizam como fonte de informação (onde há, sim, canais sérios e importantes) tenham ficado sem esse meio, nenhuma plataforma é insubstituível, e a vida continua sem elas. Quem sabe, até ganhamos um tempo valioso sem mais uma tela para prender nossa atenção, permitindo-nos ouvir os pássaros que tuitavam do lado de fora.